Bossa
Bossa…
Porque é ao som de bossa que te escrevo.
Pequenino, e dirijo-me ao menino de 4 anos, que ainda deseja que a avó viva para sempre. Ela é eterna, vive em ti. Muito lutou para te conhecer. Não deixou que a tristeza a matasse quando lhe levaram o marido e depois o filho, só para te conhecer.
Com uma ânsia enorme de se rever em ti e de te transmitir tudo, os ensinamentos de vida dela e dos amores que a vida lhe tinha roubado, porque o tempo urge e termina quando menos esperamos. E ela, mais do que ninguém, sabia-o.
Das poucas vezes que coscuvilhei uma conversa entre as nossas duas mães maiores, a avó estava sentada na cadeira, na sua cadeira, e não no sofá da sala, com o corpo semifletido, o cabelo grisalho preso por um lenço negro e vestida de negro, como sempre, aliás, a fazer croché, enquanto partilhavam experiências de vida. A dor marcou-a, e a roupa tingida de negro, não mais a abandonou. No meio de muita troca de impressões, ouvi uma frase que me marca até hoje e que tenho registada no meu diário dos 13 anos: “Eu vivo para o meu menino”.
Também tu vives para ela… mas não por ela. Ela merecia ver-te feliz, merecia que vivesses por ela tudo o que a vida não a deixou viver. Merece as tuas memórias, merece o teu amor… Amor? Sempre amas uma mulher! Merece o teu amor tal como tu mereces ser amado.
Hoje, mais cansada do que ontem mas, concerteza, menos do que amanhã, resolvi pedir-lhe uma ajuda: “ Avó, escrevo-lhe para lhe pedir uma ajuda. Ajude-o a ser feliz, mais, ajude-o a querer ser feliz. Não o deixe desistir da vida. Diga-lhe que também tem muitas saudades e que ele é, e será sempre, o menino dos seus olhos. Conte-lhe como foi feliz quando ele foi feliz. Conte-lhe que na sua raça morresse quando se decide e não porque alguém deixa. Conte-lhe que decidiu morrer quando chegou a sua hora, tal como decidiu viver e criá-lo quando a morte lhe levou dois grandes amores. Conte-lhe como valeu a pena andar pelo mundo para o ver crescer. E como cresceu! Acredite! Conte-lhe como a felicidade se consegue do nada e que nunca vai ser plena. Conte-lhe como a vida renasce quando parece já não ter remédio. Conte-lhe que zela por ele e que lhe enxuga todas as lágrimas. Conte-lhe o que é ter um filho, amar incondicionalmente. Conte-lhe a felicidade que sentia quando o ouvia debitar mais uma das suas poesias. Imagine, um bisneto pestanudo e rebites, a declamar poesias aos 4 anos! Não o deixe decidir que vai morrer vivo. Por favor!
Será que me ouviu? Espero que sim. Porque sei que se conseguir ouvir-me vai ajudar até no que não puder. E se não lhe consigo falar? E se o amor não bradar aos céus?”
Se a ela não chegar o meu pedido, que chegue a ti: “Sê feliz”. Não vai ser fácil, eu sei. Às vezes surpreendo-me a pensar: “Como consegues, sequer, sobreviver!”
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