Morcegos em peregrinação
(Foto by Helder Maurício)
Moram morcegos sob o candeeiro em frente à minha casa.
Durante muitos e longos anos julguei que fosse apenas um, que desenhava círculos em volta da luz. Ciclos perfeitos, com coordenadas precisas, passava sempre na mesma área e a uma velocidade extraordinária.
Julgava-o à procura de algo, determinado e astuto. Mas sempre na mesma zona, descrevendo a mesma rota, há tantos anos, e nada. Não estaria cansado? E que solidão. Não tem amigos, namorada, família? Talvez prefira a solidão da noite e o meu espreitar da varanda enquanto rego o bonsai. Admirava-lhe a persistência.
É como se saísse e entrasse deste para outro mundo e vice-versa, quando desaparecia na escuridão da noite. E a cada volta e entrada na escuridão, pensava: “Será que encontrou o que procurava e decidiu partir?” Não. Eram mais meia dúzia de segundos e ele tornava a aparecer à luz, negro e veloz, com a pontualidade que o caracterizava e parecendo manter a mesma determinação.
Mas afinal são dois, dois companheiros de viajem. Que voam com tal sincronia que parecem apenas um. Tão compassados que parecem uma só melodia e não duas e que no conjunto soam muito, muito bem.
Parece que pretendem ludibriar alguém, fazer acreditar que são um, somente um. Como se fosse possível seguir um caminho comum, não de um ou de outro, dos dois.
Lembrei-me dos morcegos do meu candeeiro quando um amigo me contou que o caminho para São Tiago de Compostela permite, ao longo de todo o seu percurso, caminharem dois, passo a passo, lado a lado.
Eu prefiro caminhar como os morcegos, como um só.
1 Comments:
Por vezes não vêmos o que nos rodeia... apenas olhamos... há q estar desperta... p caminhar...
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