Demolição
Fui demolida. Quais estruturas de base? Quais pilares de apoio? Estou no chão. Estatelada no meio do nada, no vazio dos dias, na ausência do sonho, perdida na incerteza do amanhã. Certo? Certo é que não sou a mesma. Não sou do que acredito, sou do que é possível e é tão triste. É tão triste ser-se o que se pode e não tudo o que se podia ser. É tão triste olhar para trás e ver-me desacreditada. É tão triste passar a acreditar diferente, mais real, mais miniaturizado (verdade, fiquei fã).
A demolição foi eficaz, lenta, mas certeira. Adiada repetidamente, morria sempre o manobrador do aparelho de demolição e quando este estava presente eu desviava-me da bola demolidora. Raios, ainda não estava preparada. Nunca estava preparada. Isto de ter demolição com data marcada tem muito que se lhe diga. Assumir o choque, deixá-lo fazer o seu trabalho e sentir-me estilhaçada, não me parecia nada fácil.
A culpa é minha. Aliás a culpa é sempre minha. Pouco mais culpo senão a vida pelo que me oferece. E ainda assim estou a ser injusta. Porque a escolha é sempre minha. Porque a vida não me impõe o que me apresenta. Porque posso sempre dizer NÂO. Porque demolida, estilhaçada, mas pedra, e só me pisará quem eu deixar. Porque posso sempre voltar a trás. Porque posso sempre dizer sim ao não e não ao sim. Porque as demolições são previsíveis. Porque basta estarmos atentos. Porque se tivermos a inteligência de o perceber antecipadamente, a demolição é embargada e depois de embargada só uma ordem judicial a reanima. Ainda assim, se por um milagre for desembargada, o maquinista pode sempre morrer mais uma vez. E se o maquinista resolver honrar o compromisso e passar a perna à morte, há tantos cantos onde nos podemos esconder. Porque o mundo é o que é e não aquilo em que acredito, eu devia ser diferente, devia ser menos fiel ao que sinto e aproveitar o que a vida me dá. Não consigo e choro o que perdi.
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