Lobo vestido de pele de cordeiro
Admito que pensei que era meu, mas por um mero instante. Quando te questionei sobre o mesmo, já não era meu, era da tua avó. Foi só um milésimo de segundo de insanidade com recuperação muito rápida, voltei ao lado da linha que conquistei. Mas claro que o identificaste, só tu poderias achar, sendo o grande conhecedor de mim e da loucura que me caracteriza, que me poderia ter passado pela cabeça tal ideia.
Se um dia esperares por mim (LOBO: Quem? Eu? Temos algum assunto pendente? Um dia vais-me querer e não me vou autorizar a ter-te!; CORDEIRO: Porquê? Qual é o mal de agora? E se eu não esperar? E se eu já não te amar? E se não deixar que te voltes a aproximar? Tu partilhas o teu corpo, o teu espírito, fazes amor, com outra. Não vou conseguir voltar a sentir-te meu.), não guardes rancor pela saudade (LOBO: Saudade? Não sei o que é.; CORDEIRO: Não é rancor, é desencanto, é tristeza, é magoa, é abandono, é só, saudade.)Se mais tarde me vires (LOBO: Fecho os olhos com força para que não voltes a entrar em mim! Querias tu voltar a ver-me em pêlo! Mesoterapia? Jamais verás o resultado!); CORDEIRO: Não sei se o desejo. Sinto-me enganada no que vivi. Culpa minha que vi o que não existia. Ludibriei-me.), não penses que sabes de mim (LOBO: Sei de ti o que preciso saber! CORDEIRO: Não sei nada. Mas acredito pouco. Muito pouco, no que tu poderás vir a ser. Espero que até tu não saibas de ti, porque saberes o que fazes ou o que deixas de fazer, devia magoar-te, deixar-te morto.)E, se nunca puderes ter o espaço dos meus olhos, (LOBO: Nem espaço, nem tempo, nem nada! Perdeste-me para a vida! Burro! Nem conseguiste ver o espaço que tinhas nos meus!; CORDEIRO: Olhos lindos, que adoro, mas em que já não consigo acreditar. Não têm espaço para ninguém. Nem para ti. Perdeste-os algures no tempo ou no espaço, num mundo que não é o teu e em que não acreditas.)Guarda na memória o tempo que roubaste ao relógio,em que sonhavas comigo. (LOBO: Sim, sim, conta com isso! Apagar-te-ei na primeira oportunidade. Com o mesmo facilitismo com que deixaste de acreditar, com a mesma velocidade com que me penalizaste por um erro, com a mesma destreza com que te despedes. Faz-te Homem e diz-me que não me amas! Desiste definitivamente, não deixes em reserva, podes estragar a colheita! Burro!; CORDEIRO: Foi só um sonho, amor. Tu, tal como te via, não existes. E se exististe, eu perdi-te, no entra e sai da nossa vida. O nós que vi, mas não vivi aos 13, não morreu, só estava adormecido, mas mantinha todo o encanto. O nós em que acredito, foi desacreditado, a minha alma gémea, a alma que me acompanha desde os meus 13, tu mataste! Assassino! Mataste o nós! Espera. Ele só não existia, porque se existisse, tu não o conseguirias matar. Desculpa. É tão mais fácil encontrar um culpado.)
Eu não sou LOBO vestido em pele de CORDEIRO. Eu sou os dois. Consigo ser do mais meiga e fiel, tu sabes, eu já “tratei” de ti, com o zelo de uma companheira e a carícia de uma amante. Mas também sou lobo, matreira, teimosa, rude, perspicaz, ruim, mentirosa, defensiva, desconfiada… Não sou mansa, definitivamente… Se era mansa que procuravas, enganaste-te redondamente.
Luto por tudo em que acredito até onde o orgulho me permite e a vida me deixa. E quando esta me rouba o que eu tenho como meu, revolto-me, esperneio, pergunto porquê, tento perceber. E só quando percebo, descanso. Por isso não gosto da morte, não a percebo. Por não perceber, não estou em paz…
Mas como qualquer lobo, respeito o líder da matilha e sigo-o fielmente. O lobo teria sido teu, tu sabes domá-lo. Aliás, só tu o soubeste domar com a arte e o desempenho de um mestre. Mas nunca me conseguirias amestrar…
Será que é assim que és feliz? Será que é assim que confias? Quando te receiam pelo medo. Até pelo medo de te perder…cruel, não achas? Nunca vai resultar em respeito mútuo. E a ausência de equivalência, o desequilíbrio na balança do nós (tu e a companheira que te respeita, cegamente, mas por quem, tu, não tens igual respeito), vai-te, sempre, arrastar para longe, ainda que resistas. Mais vale arriscar a perda, do que viver morto…
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