Thursday, December 22, 2005

Ofereci caixinhas que nem eram minhas e ganhei o céu


Ofereci caixinhas que não eram minhas, já eram de quem as ofereci, e ganhei o céu. Eu não acredito, não sou crente, o céu não é o meu limite, mas aquele céu, aquele que o Sr. Baldé me ofereceu, eu aceitei na hora e agradeci com o mesmo coração com que me foi dado.

Africa persegue-me e ainda bem, porque eu ainda faço a tal missão de cabelo loiro atado, roupa à explorador, mãos sujas do trabalho e muitas caixinhas para dar e muito para fazer e muito para ajudar. Em troca só quero o sorriso e o céu do Sr. Baldé.

O Sr. Baldé é negro, tem um sorriso pepsodent e é de tal forma simples e simpático que conquista à primeira investida. O Sr. Baldé é muito doente, tem muita vontade de se tratar mas, infelizmente, não tem como. Eu ofereci-lhe todas as caixinhas que tinha dentro da minha caixa das caixinhas e ele deu-me automaticamente o sorriso pepsodent e o céu. E não parou de agradecer até fechar a porta e ainda voltou atrás a desejar Bom Natal e a oferecer-me mais um bocadinho de céu.

Quando voltar, Sr. Baldé, vai ter mais caixinhas à sua espera, prometo.

Os amores comem-me pedaços...


... as feridas sangram, eu não consigo sobreviver e morro aos poucos. E perco-me de mim. E a vontade é de desistir. E a vontade é de me entregar.

... o ataque do tubarão é certeiro, sem aviso, e rouba-me pedaços vitais. E eu já fui amor e de bom grado seria presa. E eu não sou predador, mas ele foi, é e sempre será. E no amor ama-se mais o próximo do que o próprio e o sofrimento espelhado é insuportável. E eu amo assim, mas não sou amada assim. E o amor não tem definição. E o amor é para mim aquilo que não é para ti, não é, nem tem que ser.

...somos dois, mas já ambicionamos a ser um. E de bom agrado deixaria que te alimentasses de mim. E de coração seríamos comensais. E poderias devorar-me a todo o instante que nunca me sentiria ferida. E se ferida e feliz, então ferida. E cresceria carne nova e fresca para que dela te alimentasses. E eu não sou, nem nunca serei, capaz de te roubar pedaço. E seríamos um só.


...devo ter um qualquer problema de coagulação, porque sangro em grande quantidade e durante muito tempo, porque não saro, porque me custa ultrapassar. E dói mais quando não percebo. E dói mais quando fui eu. E dói a suposta normalidade aparente. E dói o silêncio. E doem os “nim”. E dói a distância imposta. E dói tudo, dói-me tudo quando nunca me dói nada.

...és um tubarão velho, com várias investidas na história, com muita história na minha vida, com muitos pedaços de mim. Os pedaços que me comeste são teus, arrancados, mastigados, engolidos e digeridos com o prazer que o momento impunha. Irrecuperáveis, teus para sempre e parte integrante do teu ser, do teu corpo. Não me faças sentir que foram perdidos. Não me faças sentir que morri mais um pouco por ninguém. Não nos desacredites mais do que quando nos trocaste pela estabilidade. Não desacredites mais a diferença que continuo a sentir no que somos juntos. Por favor, não me desacredites apelidando o que tivemos, temos ou poderíamos ter tido de potencial relação saudável e normal.

.... Eu gosto de amores assim, que me devoram como se não houvesse amanhã. Amores em que acredito e que me deixam de rastos quando não são. E este amor é antigo e resistiu ao tempo. E este amor eu sempre vi e nunca acreditei. E quando vi e acreditei deixei de ser vista. E o amor perdeu-se. E o amor partiu e nem lutou. E o amor só é amor se eu o continuar a acreditar mesmo depois de impossível, se o viver mesmo depois de morto, se não o esquecer a cada segundo do meu tempo. E eu sou assim porque este amor é assim, grande. E ainda que depois e não há depois, porque este amor não é ultrapassável, não tem barreira, e ainda que para sempre tenha que apanhar os pedaços desprezados no fundo do mar, que não serviram de alimento a ninguém, eu acredito e vou sempre acreditar, por isso sou uma clara sonhadora.

... comem-me pedaços e não deve ser saudável, mas não faz mal porque eu sou claramente uma sonhadora e nunca vou deixar de acreditar...

Monday, December 19, 2005

54

Porque detesto números impares e adoro beijos. Porque a vida não me corre de feição mas eu sou do contra. Porque não sou fácil e detesto que me levem a melhor. Montes e montes de beijos para a vida. Sim, porque não penses que me vences.

A vida em jogo

A vida é um jogo de xadrez.
Eu a torre que fugia a um ataque certeiro.
A vida fez-me xeque mate...
Estou caída no meu canto do tabuleiro.
Quem foi a peça que me derrubou?

Demolição


Fui demolida. Quais estruturas de base? Quais pilares de apoio? Estou no chão. Estatelada no meio do nada, no vazio dos dias, na ausência do sonho, perdida na incerteza do amanhã. Certo? Certo é que não sou a mesma. Não sou do que acredito, sou do que é possível e é tão triste. É tão triste ser-se o que se pode e não tudo o que se podia ser. É tão triste olhar para trás e ver-me desacreditada. É tão triste passar a acreditar diferente, mais real, mais miniaturizado (verdade, fiquei fã).

A demolição foi eficaz, lenta, mas certeira. Adiada repetidamente, morria sempre o manobrador do aparelho de demolição e quando este estava presente eu desviava-me da bola demolidora. Raios, ainda não estava preparada. Nunca estava preparada. Isto de ter demolição com data marcada tem muito que se lhe diga. Assumir o choque, deixá-lo fazer o seu trabalho e sentir-me estilhaçada, não me parecia nada fácil.



A culpa é minha. Aliás a culpa é sempre minha. Pouco mais culpo senão a vida pelo que me oferece. E ainda assim estou a ser injusta. Porque a escolha é sempre minha. Porque a vida não me impõe o que me apresenta. Porque posso sempre dizer NÂO. Porque demolida, estilhaçada, mas pedra, e só me pisará quem eu deixar. Porque posso sempre voltar a trás. Porque posso sempre dizer sim ao não e não ao sim. Porque as demolições são previsíveis. Porque basta estarmos atentos. Porque se tivermos a inteligência de o perceber antecipadamente, a demolição é embargada e depois de embargada só uma ordem judicial a reanima. Ainda assim, se por um milagre for desembargada, o maquinista pode sempre morrer mais uma vez. E se o maquinista resolver honrar o compromisso e passar a perna à morte, há tantos cantos onde nos podemos esconder. Porque o mundo é o que é e não aquilo em que acredito, eu devia ser diferente, devia ser menos fiel ao que sinto e aproveitar o que a vida me dá. Não consigo e choro o que perdi.

Definitivamente...


...não estou nos meus dias. E não estou nos meus dias porque não tenho onde me agarrar. A morte morreu, o reinado das trevas terminou e eu continuo nas malhas da morte. Enquanto morta vai ser enterrada e eu sou enterrada com ela.

Revolta-me...será que é revolta? Nem sei o que é, só sei que dói, que me enche os olhos azuis de lágrimas e que me sinto a sufocar na imensidão dos dias. Que vou ser enterrada viva porque acreditei que a morte era verdadeira, que a morte reinava, que tinha vindo para ficar e que por isso eu não o podia ter. Só eu acredito na morte anunciada. Só eu acho que não sou trocada pela vida. Só eu acho que só a morte me vence e que esta me vence porque é definitiva. Isto já não é ingenuidade é burrice. Como pude eu acreditar no anuncio da morte?

A morte morreu e eu morri com ela. Morri eu e tudo aquilo em que acreditava. E mais uma vez os meus olhos choram. Já não consigo escrever sem chorar. Este blog nasceu com a morte e a morte morreu.

Já tinha entregue o troféu à morte, mas esta perdeu-o para a vida em astro e eu não valo nada. Eu não lhe ganhei e ela perdeu no primeiro round com uma jogadora da primeira divisão. Sou, definitivamente, duma divisão rasca. Não ganho nenhum jogo quanto mais um campeonato. A morte nem perdeu tempo a agendar jogo comigo, eu não valo a pena, sou carta fora do baralho. O Ás é outro e eu nem rainha fui.

A morte morreu e eu morri com ela. Talvez nasça outra, mas eu, eu que acreditava no amor de uma vida, eu que acreditava viver um amor diferente, eu que acreditava que tinha perdido para a morte o meu amor, eu que tinha decidido zelar pelo meu amor morto, eu que tinha decidido estar por perto para quando ele despertasse para a vida, eu que...fui definitivamente cega, morri. E comigo morreu muito do que eu sou. E comigo morri eu.

Com a minha morte tu ressuscitaste por outra vida viva. Que um de nós esteja vivo e feliz. Porque eu morri. Felicidade? Nem cheirá-la. E sabe-se lá se ressuscitarei...

Saturday, December 17, 2005

Africa


Sempre adorei Africa. Nem sei muito bem porque. Só conheço a Praia – Cabo Verde e nem me fascinou. Senti-me mal enquanto turista, de canga e bikini, a passear por ruas de pés descalços, de t-shirts rasgadas, de muito pó e de muita pobreza.

A beleza não é só a paissagem, são as gentes e eu acabei por conhecer gente muito gira. O mais grandioso é que no meio de tanta pobreza, são felizes, simplesmente felizes.

Já tinha levado alguma coisa para dar mas acabei por dar tudo o que tinha, roupa, pasta dos dentes, champô, amaciador... O amaciador foi prenda para uma portuguesa de alma africana que se deixou prender pelos mares de Cabo Verde. Olhou-me com uma imensa gratidão, pela oferta do amaciador, e ainda hoje recordo aquele olhar. Ali o amaciador não foi só um amaciador, foi um regresso a casa, foi, de certo, uma mordomia, foi uma oferenda grandiosa. Quem diria, um amaciador...

Quando penso em Africa penso sempre numa grande missão. Vejo-me sempre de cabelo atado, roupa à explorador e mãos sujas de tanto trabalhar. Imagino-me a distribuir medicação, a fazer partos, a ajudar. Imagino a gratidão espelhada naqueles rostos e o brilho daqueles olhos. Imagino-me de chinelo no pé. Imagino-me a andar muito, a percorrer léguas de terreno árido e a encontrar um oásis a cada esquina do nada. Encontrar um oásis de compaixão, de alegria, de gratidão, de entrega, em cada rosto negro, em cada família, em cada tribo.

Adoro a paisagem da Savana Africana. E, por não a conhecer pessoalmente, gosto de quem ma mostra. Por isso me apaixonei por estes quadros, que à posteriori descobri serem de Leonel dos Santos. O intuito deste post era apresentar-vos este ilustre desconhecido que, na minha humilde opinião, retrata a savana com a simplicidade que ela pede. Só assim. Traços simples. Cores de sol, quentes, escaldantes, longínquas, só acessíveis à percepção de quem vive Africa (seja lá que o isso for, viver Africa). Se fossem gente, os quadros, seriam de poucas palavras, mas acertivos. Seriam chocolate, quente e doce. Se fossem gente seriam carácter, luta, determinação, resistência. Se fossem gente seriam paixão.

Leonel dos Santos nasceu em Moçambique, na Cidade da Beira, em Abril de 1964 (Touro. Claro!). Estudou na Escola de Artes Decorativas António Arroio, onde tirou dois cursos: Curso de Artes do Fogo (Giro. Lá esta a capacidade de expressão em tons sol); e o Curso de Imagem.

Participou em cerca de quatro exposições colectivas em Portugal e na Alemanha. Fez duas exposições em nome individual em Portugal e uma única na Alemanha. A grande maioria das exposições realizados em Portugal ocorreram no Alentejo e em Lisboa. O pintor adoptou o Alentejo como segunda pátria e já o pinta com alma.

Encontrei-o perdido numa loja de pintura no Colombo e apaixonei-me pela simplicidade do traço. Os quadros já moram no branco da minha parede.

Há dias...


Há dias menos bons.

Há dias em que não percebo o que faço por aqui.

Há dias em que desacredito e em que sou desacreditada.

Há dias em que não gosto do que sou, nem do que faço.

Há dias em que estou amarga e há dias piores em que sou amarga.

Há dias em que não gosto de mim.

Há dias em que entrego a minha existência à revolta e à escuridão do meu quarto.

Há dias em que não faço nada.

Há dias em que sinto pena de mim.

Há dias em que acredito que fiz muito mal a alguém. Muito mal a muita gente e muitas vezes. Só assim percebo o porque de tanto castigo, de tanto sofrimento.

Há dias em que desprezo o mundo e dias piores em que me desprezo a mim.

Há dias em que não sei quem sou.

Há dias em que não acredito que possa vir a ser feliz.

Hoje é um desses dias ...

Wednesday, December 14, 2005

Gralhas do nosso Portugal Continental e Ilhas


Não estão sempre? Direcções a sair e a entrar? A vida parece a função pública das direcções, muda a toda a hora sem aparente justificação. Muda com o governo e com o tempo. Muda com a estação e só porque sim. Seguiremos nós as direcções que a vida nos parece impor?




Ele há sempre paixões de infância, ainda nem largámos as fraldas, mas já achamos que aquele é o amor da nossa vida. E o irónico é que às vezes acontece mesmo. Encontrarmos o amor da nossa vida ainda na infância.



Desculpa?!? Entro ou saiu? Pronto entro e sirvo-me. Já sei, faço como se tivesse em casa.






Prato principal, polvo descabeche. Sobremesa, pudi. Nunca provaram? Servido com um bom vinho é delicioso.




Mas fico só para jantar. A tua vida proíbe-me de ficar mais tempo.




Pois o problema é que esta cena não resulta, é desrespeitosa para seres que se dizem inteligentes e evoluídos, e ainda que não fosse, nos dias que correm é difícil confiar na palavra de uma pessoa quanto mais na palavra de um par. E eles andem por aí. Acreditem que andem e são feios, porcos e maus. Não acontecem só aos outros e não poupam nenhuma faixa etária, preferência sexual, classe ou profissão. Ah pois é. E fazia agora uma sessão de esclarecimento sobre o assunto, mas o que não falta é informação na Net, pelo que em caso de dúvidas não deixem de se informar.




Não ficas, eu não posso ficar e a minha vida tornou-se um beco sem saída.




E eu que cheguei a achar que a minha vida tinha ganho sentido. Enganei-me? Não tenho a certeza, mas tu tens e isso é suficiente para destruir o sonho.


(fotos by Patines e Helder Maurício)

Falando de menino Jesus...

...não resisto a estas fotos...






Concordo. Se acontecer, um dia mau, basta recordar este sorriso e tudo passa a ser relativo. Como pode alguém não querer na vida um para si. Em toda a vida, e não é pouca, não ter tempo ou espaço para o encaixar. Ás vezes acaba subitamente, a vida, mas ninguém a constroí a pensar nisso. E quando acontece, acabar de forma inesperada, a grande maioria das vezes a proximidade da morte arrasta sentimentos de pena pelas prioridades invertidas.


Não querer um que nasça de nós e daquele que amamos? Um com os teus olhos, pestanudo, com o teu rabo rebites e com o sorriso e suavidade da mãe.

Sejas tu quem fores, meu grande amor, quero ser mãe de um filho teu.

As tarefas do meu menino Jesus - Tarefa II

Esta foi auto-infligida. Completamente inventada. Achei que era giro retribuir à Escola a simpatia de promover a reunião familiar no desempenho de uma missão. Nos dias que correm, em que dormimos depressa para acordar de manhã e trabalhar o dia todo, todos os esforços para promover a união familiar são bem vindos, pelo que resolvi fazer a minha boa acção do dia e retribuir à escola com uma prenda original criada pelo Jonh e pela família.



Como somos meio megalómanos e muito pouco singelos construímos uma residencial. Residencial de um único piso, mas muito espaçosa, decorada a rigor e com lareira, com este frio toda a residencial que se preze tem que ter lareira. Rodeada por um terreno tratado e cuidadosamente jardinado, com três grandes arvores de folha caduca, despidas pelo frio e um lago natural resultando da envolvência do rio vizinho. Ahh, essencial para os citadinos, e esta residencial situa-se em Lisboa, junto ao nosso amado Rio Tejo, tem garagens para todos os residentes. Como aliás podem ver pelo número de carros estacionados.

Utilizámos os materiais que tínhamos disponíveis, porque o período é de partilha e não podemos desperdiçar nada, e emprestámos para moradores uns seres que já lá tínhamos por casa, morada partilhada. Hoje em dia quase tudo pode ser partilhado, a morada, as custódias, as gentes, os amores…

Teve direito a arquitecta, engenheira de interiores, serralheiro e o pequenino era mão para toda a obra, sendo que comeu parte dos habitantes durante a mudança. Vá lá, não ficou com uma valente dor de barriga. Confesso que também desapareci com um ou dois…



Fiquei deliciada com o resultado final…

As tarefas do meu menino Jesus - Tarefa I

O meu amor pequenino trazia trabalhos de casa relacionados com o período de festas que atravessamos, o Natal.

Tarefa número I: decorar um anjinho de papel. A decoração deveria ser realizada em família e o anjinho ser portador de um texto incorporado pelo próprio do espírito natalício. Eu fui informada "à última da hora" mas não podia deixar que o meu pequenino fosse com um anjinho menos que LINDO para a CEBI, pelo que pus a imaginação à obra e fui recolher material para a tarefa encomendada no final da noite, da véspera da data de entrega do dito cujo. Não faz mal, eu trabalho bem sob pressão. “E o material?” – perguntavam. “Não comprámos nada!” Tutu benne. Usamos o que encontrar pelo caminho. Recolhi de quase tudo. Informação da Net, algodão, folhas e flores secas que estavam espalhadas lá por casa e um belo de um texto de natal. O resultado final foi este:



Talvez não se consiga ler o texto, pelo que aqui vai: “A melhor mensagem de Natal é aquela que sai em silêncio dos nossos corações e aquece com ternura os corações daqueles que nos acompanham na nossa caminhada pela vida”.

Porque está na idade dos porquês (alguma vez passamos esta fase?), porque é inteligente como a breca (saí à tia :-)) e porque o objectivo não era só “produzir” um anjinho, tive na conversa com o Jonh (o meu menino Jesus). Os temas foram variados, falámos sobre a economia mundial, sobre a fome no mundo, sobre o buraco da camada de ozono…credo, claro que não. Deixá-lo descobrir as cenas más a seu tempo. Já sabe o essencial:” Tia, a água é um bem escasso e não podemos desperdiçar água”. Ah pois é. Um bem escasso é termos um puto que fala assim aos quatro anos (sou uma babada, eu sei). Em linguagem infantil, mas não muito, o puto já fala como gente grande, à sete tostões e meio (ou seja, em euros, ora, sete vezes dois, ora bem, mais quatro, a dividir por dois…bom, façam as contas), como diz a mama dele, falámos sobretudo sobre o Natal e focámos a atenção no menino Jesus. E a dada altura perguntei, vai: “Mor, quem é esse Sr?” Vem: “Tia, não é um Sr, é um bebé.” Daaahhhh, claro que não é um Sr. Vai:”Então e esse bebé anda lá na tua escola?” – pergunta pouco inteligente. Vem: “Claro que não. Anda na missa.” Vai: “Olha, e quem são os pais desse bebé?”. Vem: “Não sei, ele não anda lá na minha escola”. Muito complicado apresentar a uma criança um menino Jesus em que não se acredita. O que deveria dizer a seguir? Deixou-me desarmada, fiquei sem argumentos e passámos a falar do Noddy. Deixo a história do menino Jesus para os avós que são crentes e que lhe vão saber explicar o que é ter fé.

Parece que era o anjinho mais LINDO do colégio. Missão cumprida.

Sunday, December 11, 2005

Candeeiro de azeite III


A saga dos candeeiros de azeite...só a brincar, não tenho mais desenvolvimentos na história dos candeeiros de azeite. Estes são os candeeiros de azeite. Foi um amigo que a encontrou e me enviou. Fica desfeita a imprecisão.

Candeeiro de azeite II

Porque a mensagem é mesmo importante. Porque pensei sobre o assunto e há mais uma ou outra coisa a respeito que gostava de partilhar. Porque o acho incompleto...

Este octogenário foi-me apresentado numa cama, com uma fácies inexpressiva, os músculos estavam comidos pelo descanso antecipado e prolongado no leito, estava muito emagrecido e não se lhe conseguia arrancar palavra. A idade também tem destas coisas. Ficamos mais vezes doente e qualquer doença é logo de caixão à cova, literalmente. Mais sensíveis e menos resistentes. Mas aprendi com este octogenário outra lição que não o candeeiro de azeite, não desistir nunca de alguém octogenário que se nos é apresentado assim. Arrancá-lo à doença, é arrancá-la daquela cama que o comia vivo, é dar-lhe vida, é ressuscitar a sapiência insípida, é dar-lhe voz. E foi isso que aconteceu com este octogenário que pouco tempo depois me trazia mais lições de vida. O segundo encontro foi bem mais agradável, caminhava pelo seu pé, tinha o aspecto de um qualquer senhor britânico do antigamente, com o seu blaser malhado e o seu lenço ao pescoço. Estava perfumado e cheirava muito bem, adoro homens que cheiram bem, adoro a mistura da pele com um bom perfume. E nem foi preciso arrancar-lhe discurso algum. Este surgiu espontaneamente e mostrava a sapiência de uma vida de vida.

Porque fiz o paralelismo com um comentário que me fizeram há uns tempos e que eu não consegui atingir por completo na altura (isto o tom de cabelo tem muito que se lhe diga, enleia o tico e o teco e depois a cena fica mais lenta, mas devagar, devagarinho eu chego lá). O pavio é importante mas o azeite...o azeite tem que ser da melhor qualidade, tem que fazer render o pavio, tem que ser saboroso, tem que ser reposto inúmeras vezes, sempre que for preciso e tem que ser preciso muitas vezes, tem que ser reluzente, tem que, na medida do bom senso, fazer esquecer o tamanho do pavio. Lá está, a vida bela, grande mesmo que miniaturizada. E a vida miniaturizada pode ser só uma vida curta, mas plena, muito grande e bela (Será que atingi? Ainda que não seja a ideia inicial, não me parece um mau paralelismo. O que te parece?).

Não podemos, de todo, usar azeite de menor qualidade. Não podemos desperdiçar o pavio que nos foi destinado com azeite em segunda mão. Não podemos deixar o pavio com sede. Não podemos desperdiçar tempo de combustão deixando para amanhã o azeite que podíamos repor hoje. Não podemos deixar apagar o pavio por falta de azeite quando ele ainda tem tanto para ser queimado, quando ainda há tanto para ser vivido. Não podemos morrer antes do tempo e achar que estamos vivos porque andamos por aqui. Não podemos, definitivamente, deixar para repor amanhã o azeite de podíamos ter reposto hoje.

Saturday, December 10, 2005

Candeeiro de azeite

(Desculpem a imprecisão da imagem. Não encontrei candeeiros de azeite.)



Há muito tempo atrás, um octogenário contava-me uma história que dizia o seguinte: “Menina (chamam-se sempre menina, tenho cara de miúda), a vida é como um candeeiro de azeite. Vamo-la alimentando com azeite, mas a dada altura o pavio termina e não há azeite que nos valha”.

Atenção à idade que é, sem sombra de dúvida, um posto. Atenção ao que uma vida de vida ensina. Atenção aos conselhos dos velhos, são antigos e mais do que documentados.

Achei uma comparação deliciosa. Este octogenário teve ainda o bom senso de concluir: “Menina (não me escapo ao menina e até já acho estranho quando não precede o discurso de uma qualquer pessoa com mais idade), o meu pavio terminou, não há azeite que me valha”. Ele sabe que o pavio é curto, ele já o sente na pele.

Tento contar tantas vezes esta história...Tento contar todas as vezes que me cruzo com alguém que desperdiça a vida e repito-a vezes sem conta para mim.

Um amigo...


...um amigo muito, muito antigo. Com barbas longas e brancas. Que está, actualmente, em missão num qualquer país estrangeiro, distante e gelado. Coberto de neve branca e com imensos mares gelados. Com gente inóspita e distante. Um amigo longe mas muito, muito antigo, longe, mas de sempre, dizia-me que eu merecia o céu, um ramo de flores e uma caixa de chocolates. Pois sabe que pretendo cobrar tudo (vou gostar de ver como te vais desenrascar...).

Friday, December 09, 2005

SUBCONSCIENTE


Hoje recebi uma mensagem diferente que dizia: “O teu inconsciente é um perigo. O teu consciente nem se fala...”. Fugiu-lhe a boca para a verdade porque do que me queria, com certeza, falar era do meu subconsciente. Saiu-lhe inconsciente e deve ter alguma razão.

Eu chamo-lhe distracção, impulsividade, comportamento não programado, consequências não ponderadas. Eu chamo-lhe vontade, desejo. Ele chamar-lhe-á, com certeza, qualquer outra coisa.

O dia terminou...


...o dia terminou e a lua é o olho semi-cerrado de um gato sedutor que me espreita e do qual não consigo fugir. É inquisidor e pergunta-me pela vida. Confesso-lhe que desde que me conto a alguém, desde que mostro a minha alma ao mundo e em particular ao meu amor 13, que descobri que não sou o que pensava. Passar para palavras o que sentimos, o que achamos ser capazes de fazer, as vontades súbitas, os desejos arrebatadores, os ódios puros, os amores não correspondidos... passar para palavras o humor instantâneo, aquele que se prepara em segundos e está pronto para ser consumido, aquele que tem vários sabores, amor, ódio, raiva, tristeza, medo, vingança, desejo, aquele que tão depressa cozinhamos e que tão depressa desaparece, devorado pelo apetite voraz da consciência, faz-me perceber que não sou boa, não sou má, sou péssima pessoa. Faz-me perceber que há uma qualquer peneira que me impede de pôr em pratica aquilo que penso ou sinto, que há um qualquer temporizador que me faz lembrar dos outros e perder o apetite, que tenho um qualquer exaustor que afasta os pensamentos maus e que os poros do meu papel vegetal estão dimensionados à medida da metade que se aproveita do meu carácter, sendo impermeáveis a tudo o resto. Porque na prática eu não faço mal a ninguém apesar de no fundo consigo desejar, na mesma medida, o bem e o mal. Porque não me orgulho nada disso. Porque talvez todos sejamos um bocadinho assim e eu não seja mais do que ninguém. Porque procuro fazer melhor, apesar de ainda não conseguir. Porque a vida não é fácil e eu ganho a percepção disso a cada dia, talvez, talvez tenha perdão. O que te parece gato?

Thursday, December 08, 2005

Anoitecer


Com o correr do dia as vontades esvanecem-se...

Amanhecer


O meu dia amanheceu com esta ideia:”Hoje se o amanhã não trouxesse consciência e esta não arrastasse consigo os remorsos não era só dos teus lábios que matava saudades.”

Wednesday, December 07, 2005

A eternidade falhou o buraco...

Mais descansada. A morte anunciada não é para já. Ainda não tenho direito a relatório de autópsia. Ainda não sei do que vou morrer. Sim, porque morrer vou, só não ganhei a causa de morte hoje.

A lotaria rodou, rodou e a bola tinha que sair a alguém. Calhou-me a mim, o destino já havia decidido que aquela bola era minha, só não sabia a cor. Eu queria que saísse a bola branca, a bola saudável, a bola não infectada, aquela que não anunciava a minha morte certa, com relatório post mortem anexado. Aquela que não me faria sofrer, aquela que não me condenava a desempenhar qualquer outra função que não aquela que desempenho e que amo, aquela que me defenderia da dor, aquela que me permitiria ter mais uma hipótese. E enquanto a bola não saiu da tômbola pensei muito, pensei tudo. Pensei no antes, no agora e no depois. Pensei em mim e nos meus. Pensei no que sou e no que não tive oportunidade de ser. Oportunidade? Talvez não tenha feito por isso ou pura e simplesmente não o mereça. Pensei no que fazer em caso de bola negra, no caso de fim da linha. Pensava, pensava…e as bolas giravam. Dói, ficamos sozinhos, só nós estamos na probabilidade de ficarmos doentes. Aquela bola é nossa, definitivamente nossa. Podemos ter o mundo a apoiar-nos mas aquele destino é só nosso.

Senti o chão fugir-me debaixo dos pés e consegui ver o abismo. As lágrimas eminentes deixaram de o ser, saíram apressadas na direcção da tômbola tentando ludibriar o destino e batotear a lotaria das bolas, mas não venceram a gravidade e estatelaram-se no azul escuro do fundo do abismo.

Afinal não há abismo, era só o decote da minha farda, o azul ficou escuro pelas lágrimas que caíram e o destino decidiu que desta vez a bola premiada era a branca.

O destino deu-me uma abébia e eu agradeço. Serve, com certeza, de lição para o uso de óculos protectores no futuro. Serve de lição para o meu futuro e para o futuro de quem me ler e partilhar de uma profissão de risco.

Na calma do final do dia...





Gosto de me sentir calma. Gosto de sentir calma no meio que me rodeia. Gosto de sentir calmos os que me estão próximos. Gosto, definitivamente, de calma. Atenção que calmos não significa parados. Irrita-me a pasmaceira, irrita-me a inércia, irrita-me a falta de vontades, irrita-me a inactividade. Mas, definitivamente, adoro calma.

A calma é-me uma aliada. E ainda que esteja sisuda, de cara amarrada, com as mãos geladas e suadas, com o coração a saltar do peito, com lágrimas na eminência de desafiarem a gravidade, ainda que me sinta a desmoronar e que telefone desesperadamente à minha consciência na procura de consolo, a calma ou pelo menos a sua gémea aparente, é definitivamente minha aliada.

Segundo fatal


Eu sei que a minha profissão tem destas coisas. Eu sei que corremos alguns riscos. Eu sei que estas coisas acontecem, mas é tão estúpido e mete tanto medo. É tão estúpido pensar que podemos perder a vida ou a qualidade da mesma num segundo. Que podemos ficar eternamente infectados por uma merda qualquer que uma qualquer pessoa transporta consigo. Ou que a eternidade, para quem acredita nela, pode chegar mais cedo, por causa de muitos segundos de cansaço ou por castigo. Castigo porque sou ruim. Castigo porque tudo nos corre mal quando criticamos quem amamos. Castigo porque o desgosto traz incompetência e distracção, pelo que eu não deveria estar desgostosa, tenho responsabilidades e responsabilidades valentes. Castigo porque uma merda é uma merda e uma merda nunca vem só. Castigo porque a vida não é fácil e tem dias piores. Onde estão os melhores que não passam por mim? Castigo porque tudo corre mal quando tem que correr mal ainda que nos esforcemos para que aconteça o contrário.

Tenho que abrir o olho quando estou a fazer qualquer coisa, para meu azar tenho que ter os olhos abertos para ver, porque se pudesse encerrava-os com força sempre que tivesse que fazer algo. Se os encerrasse não me infectava com nada que esguichasse de qualquer vaso durante qualquer técnica. Não deixava entrar muito do que vejo e me magoa. Deixava de ver sapatos que não são meus arrumados em armários ou casacos com pelo pendurados em roupeiro e casaco com pelo não é definitivamente meu. Ai de quem matar bichinhos à minha frente! Deixava de ver o mundo e pode ser que o mundo me deixasse de ver. Podia ser que passássemos a ser ilustres desconhecidos. Podia ser que eu pudesse começar de novo. Podia ser que tudo fosse diferente. Podia ser que eu hoje fosse feliz. E que sendo feliz errasse menos. E que sendo feliz fizesse melhor. E que sendo feliz não ficasse tão triste com a eventualidade de surgir mais qualquer coisa contra a minha felicidade. Quem quereria partilhar a vida com uma loira amaldiçoada, marcada pelo diabo com sardas nos olhos e infectada com uma qualquer merda. Quem? Ninguém. Esta é uma resposta óbvia.

Acima de tudo tenho medo. Medo do que o destino me reserva. E se o destino for ficar infectada com uma destas doenças que fazem a primeira página de tantas revistas? Que motivam tanta gente para a criação de tantas associações? Que movem as gentes, no sentido do cooperativismo, da solidariedade ou as empurram para uma qualquer campa, num campo baldio, de uma qualquer aldeia alentejana, que nem vem no mapa. Ser enterrada debaixo de um chaparro não me parece mal de todo. Mas que seja rápido. A morte. Que não me traga mais sofrimento. Estou cansada, muito cansada.

Monday, December 05, 2005

Bonsais e companhias


Continuando nas companhias, tenho que me valer de qualquer coisa que me ajude a passar os dias, aqui está o meu cão. A minha Àkira, Kirinha para a família e amigos.

Pastor alemão, filha de uma qualquer cadela premiada e de um qualquer cão de origem espanhola. Meiga como só ela. Adoro o meu cão.






Frequenta uma distinta escola canina no Estoril, desde tenra idade, e cumpre ordens mediante suborno. Quer dizer quando subornada pela minha mana, porque comigo nem os subornos resultam. A única ordem que consigo soltar é: “Kira, nãããããão! Kira não me saltes para cima”. Quer dizer há variantes, Kira não me sujes, Kira não me rasgues as meias, Kira não me roubes os papeis, Kira deixa-me abrir a porta. Afinal, apesar de em tom de desespero, até dou muitas ordens. Sou muito liberal, ela depois logo decide se cumpre ou não. Não há problema.





Adoro o focinho meigo de quem espera as festas da praxe junto à porta. Já sabe que à abertura da porta de casa se segue a sessão diária de festas. Chave na fechadura, lambidela na minha face e sessão de festas, até Pavelove sabia. Adora festas. As festas meigas e calmas são minhas. A minha mana é a das festas alegres e o meu mano o responsável directo pelas festas doidas. Gosto de a sentir sossegada, calma. Ela encosta o focinho na minha perna e espera que a reconforte com festas. Prefere as festas no focinho, os olhos e as enormes orelhas são os locais preferidos. Adoro o seu olhar derretido, deliciado com carinho.



Não quer cão. É verdade. Escolhemos-lhe um namorado lindo, com lop e de boas familias, mas ela, pura e simplesmente, negou-se a procriar com um desconhecido. Acabou por se apaixonar pelo dono do prometido e não deixava ninguém chegar perto daquele, nem o dito namorado. Até o cão é alternativo cá em casa, cheia de manhas e vontades. Será de criação ou congénita? Esta nossa apetência para a alternatividade.

Continuamos à procura de pai para os seus filhos...aqueles que ainda nem foram concebidos. Aceitamos propostas de namoro. Deixem as vossas propostas neste blog.

Sunday, December 04, 2005

Eu estou triste e eles ficam assim...


Eu estou triste e eles morrem, morrem para que eu não morra. Melhor ainda, morrem à sede e sou eu que os mato. Morrem com sede de água, de atenção, de carinho. Morrem afogados em magoa, dor, tristeza, solidão. Morrem e eu adoro conseguir recuperá-los. Adoro ganhar à morte. Mas são raras...as vitórias, são raras. A grande maioria das vezes é ela que me ganha. Escolhi uma competidora de peso...

São os meninos dos meus olhos. Adoro tratá-los, adoro vê-los sobreviver ano após ano. Adoro vê-los ficar...pura e simplesmente ficam, não sofrem grandes alterações. Só precisam de ser regados na quantidade e tempo certo. Por acaso não é verdade, tem que ser regados em quantidade e qualidade, senão morrem, não perdoam atrasos. Mentira mais uma vez. Eles ameaçam morrer, sofrem imenso, demoram muitos meses, ás vezes anos, a recuperar, mas só após muitas agressões desistem. Tal como dizia ficam. Agarram-se à vida com se tivessem raízes..espera eles tem raízes, eu é que não.

Parece que não precisam de nós, parecem imutáveis, parece que subsistem sozinhos, parece que o nosso papel é pouco significativo, mas não. Sofrem poucas alterações, parecem sempre os mesmos, muito, muito estáveis, independentes, mas não são. A nossa passagem muito discreta pela sua vida é determinante. Somos o adubo que passa despercebido, camuflado pela terra escura e argilosa, mas essencial para que brotem. Somos a água que corre pelos galhos e que mergulha no solo, passa discreta, quase não se vê, mas é a fonte de vida da árvore. Somos os raios de sol que dão vida às folhas, que fazem nascer as flores e crescer os frutos. Somos companheiros de viagem. Temos um pacto, eu procuro sobreviver e cuidá-los e eles retribuem sugando-me a tristeza.



Chiuuuu... Não contem aos outros, é segredo, não quero ferir susceptibilidades, uma mãe, é uma mãe, não tem preferências, mas este é o menino dos meus olhos. É um dos mais antigos, está comigo há cerca de 8 anos e foi uma prenda de um grande amor. Já passou por maus períodos, é o mais sensível à minha tristeza, mas é também dos mais resistentes.


O bonsai da esquerda é o mais antigo e o que mais respeito. Já lhe chamo o resistente. A minha serisa era enorme, em estilo copa e esta comigo há 10 anos. Sofre de uma infecção crónica por fungos, infecção contraída por excesso de água, imaginem por culpa de quem... Quase me levou à falência com a conta do hospital e um belo dia resolveu ceder aos sucessivos ataques do fungo e morrer mais um pouco. Foi nessa altura que decidi, ou vai ou racha. Dei-lhe uma poda imensa, cortei-lhe parte das raízes e transplantei-o, completamente fora de tempo. Esteve em coma vários meses e de repente, um dia, um qualquer dia, eu nem estava particularmente feliz, aliás eu não estou particularmente feliz há muito tempo, começaram a brotar umas folhinhas verdes, verdes, nos locais mais austeros. Agora já não é em copa, será qualquer coisa tipo, bom, humm, bem, tipo indiferenciado. Mas é lindo de qualquer forma. Este é a prova viva da minha única vitória na luta contra a morte. Já tentei resgatar um amor mas ela levou a melhor e ele, o amor, de quem vou ser eterna amante, continua morto.

À direita estão os meus bebés, os meus mais pequeninos. Adoptei-os há pouco tempo, aliás roubei-os de uma grande superfície onde são vendidos ao desbarato e abandonados à sua sorte. Se pudesse salvava todos os que encontro, como não posso evito passar junto ao canil, onde esperam a morte ou alguém que os cuide. Esperam vivas, as desgraçadas, e são mortas aos poucos, tem uma morte sofrida. Dói-me quando passo e as vejo completamente despidas e secas, amontoadas sobre aqueles tabuleiros enormes, que mais parecem fornalhas. Já fiz inclusive queixa numa dessas grandes superfícies, onde encontrei as árvores completamente desnudas e com uma expressão de sofrimento que faria chorar qualquer boa pedra da calçada. Escusado será dizer que só serviu para salvar aquelas, tempos depois já lá estavam outras em agonia.

Adoro bonsais. Adoro meter a mão na terra, senti-la e cheirá-la. Adoro a floresta em casa. Adoro a variedade de espécies, de estilos. Adoro a estética da árvore. Adoro as formas. Adoro as rectas, mas amo as curvas, as tortuosas. Adoro a incógnita da orientação, do que é anterior e posterior. Adoro a poda, quase artística, não, definitivamente artística, com o toque pessoal de quem a poda, ao som do que a árvore lhe pede. Adoro a ideia de passagem de geração em geração. Adoro a ideia de troca de vida, de troca de amor. Adoro a promessa de infinito que trazem acoplada (o número de galhos tem que ser impar senão lá se perde a infinidade) e a história que levam ao próximo.

Estes são os meus meninos e assim que possa vou adoptar outros. Prometo.

Thursday, December 01, 2005

Nem tudo começa com um beijo


"É então em mundos marginais ao sistema social dos “outros” que se cultivam os sentimentos e as paixões, o carácter e o espírito de aventura”





“O amor de explosão inexplicável volta a ser o vínculo essencial, o anel libertador, a própria vida do amor, e é visto como uma imagem numa embarcação largada ao vento.”





“ (…) a suspeição e a desconfiança do próximo se passaram a justificar mais do que o antigo e incondicional “bom-dia”.”





“Concordamos todos que as coisas que cada um faz não têm importância, mas têm a grande importância de terem sido feitas, acima de tudo, por alguém.”




“O mundo das pessoas, na verdade, é em toda a parte constituído pelos que estão em certos lugares e por esses outros que obrigados ou decididamente preferem mover-se, partir e chegar. Ambos os caminhos são bons, e um justifica o outro.

Tudo o que ainda resta acabará, se uns não puderem ficar ou se outros não puderem partir. È que são sempre mais os que têm que ficar do que os que podem partir, mas nem estes podem viajar sem portos, nem aqueles poderão ficar, sem ficarem isolados.”



“Hoje, como ontem, nada de mais sublime ou legítimo nos resta do que procurar descobrir mais alguma coisa ou mais alguma aventura…”



Pedro Ayres Magalhães